Em 1833 o astrônomo e matemático John Herschel descreveu o papel da luz do Sol para a vida em seu tratado de astronomia:
Os raios do Sol são a fonte última de quase todos os movimentos que ocorrem na superfície da terra. Por seu calor são produzidos todos os ventos… Por sua ação vivificante, os vegetais são elaborados a partir de matéria inorgânica e tornam-se, por sua vez, o apoio de animais e do homem, e as fontes desses grandes depósitos de eficiência dinâmica que são criados para o ser humano.
E de fato sem o Sol a vida seria impossível na Terra!
O nosso Sol detém mais de 99% de toda massa do sistema solar que inclui planetas, suas luas e os corpos menores do sistema solar (meteoros, cometas, asteroides…). Fica a quase 150 000 000 Km de distância da Terra, ou a 1 UA (unidades astronômicas). Em um avião normal, viajando a 1000 km/h, demoraria cerca de 20 anos, para chegar ao Sol. Para nós é uma distância extraordinária, mas em termos astronômicos é algo como ao alcance do braço. Mas a nossa questão é como Sol produz brilho e calor, isto é, como ele produz energia? E qual(is) semelhanças ou diferenças em relação as estrelas.
O Sol nada mais é do que uma imensa esfera de gás incandescente, sustentada pelo equilíbrio hidrostático, ou seja o equilíbrio entre forças devido à pressão (empuxo) e à gravidade (peso), que nos permite determinar a pressão e a temperatura no núcleo solar, que é cerca de 15 000 000 K (cerca de $15 000 000^{\circ}$C), fazendo com que este suporte o peso das camadas externas. Na imagem abaixo vemos o que sustenta uma estrela:
Na verdade ainda existem duas grandezas físicas importantes para a atividade solar, como o $\vec{B}$ (campo magnético), gerado pelo movimento plasmático e responsável pela ejeção de massa coronal, e a rotação do Sol, provocada pela sua contração do Sol, que o faz girar em torno de seu próprio eixo. Mas se ficarmos apenas em função do empuxo (E) e da força peso (F), poderemos compreender bem seu funcionamento, equilíbrio e estabilidade.
Assim como um balão cheio de ar (ou gases) o nosso Sol é composto basicamente de hidrogênio e hélio (cerca de $81\%$ de H, $18\%$ de He e $1\%$ outros elementos como carbono, oxigênio,…), os mesmos H e He da tabela periódica. Na verdade, o H é o elemento mais abundante do Universo que se formou na nucleossíntse primordial. Ele é o elemento responsável pela geração de energia no núcleo do Sol através de reações termonucleares, as quais convertem o hidrogênio em hélio. A cada segundo, o Sol transforma aproximadamente 600 milhões de toneladas de H em He!
Na imagem acima é possível observar algumas partes que compõem o Sol. Começando pela fotosfera, a camada externa do Sol, forma na superfície algo parecido com um líquido fervente, gerando uma espécie de granulação (ou bolhas) a uma temperatura de cerca de 6000 K (Aproximadamente $5726^{\circ}C$). Cada bolha que se forma tem algo em torno de 5.000 km de diâmetro, e duram cerca de 15 minutos aproximadamente. Ainda na parte externa temos a cromosfera que geralmente é invisível, formando-se acima da fotosfera, podendo ser observada durante eclipses solares.
Existem ainda as proeminências, que formam laços ancorados na superfície do Sol, podendo gerar uma ejeção de massa coronal ou CME quando se rompem, uma radiação provocada pelo campo magnético que força a ejeção de plasma da superfície solar, que é um estado físico da matéria similar ao gás, mas este, devido ao superaquecimento, se ioniza (ganha e/ou perde elétrons) formando íons positivos e elétrons livres em movimento. No video que segue, temos uma dessas erupções de plasma solar, que ocorreu em 19 de julho de 2012, emitindo luz e radiação a uma temperatura de 50.000 K com uma duração aproximada de 10 horas.
Continuando na fotosfera, temos ainda as manchas solares, são regiões escuras e irregulares que podem ser observadas a olho nu, Galileu Galilei foi um dos primeiros a observar as manchas solares, publicando sobre elas em 1613. Galileu conseguiu demonstrar que o Sol estava em rotação ao acompanhar o movimento dessas manchas. Algo interessante é que essas manchas marcam o ciclo de atividade solar. Elas tem duração aproximada de 7 dias, e são mais intensas e numerosas em um ciclo de 11 anos. Durante esses períodos as erupções solares são mais intensas, gerando grandes proeminências que se desprendem da coroa solar, liberando gás ionizado e uma grande quantidade de energia, equivalente a cerca de 100 milhões de bombas nucleares, que viajam a mais de 1.000.000 km/h atingindo a Terra em cerca de 4 dias, podendo causar alguns danos na Terra, de satélites a torres de transmissão.
Em torno do núcleo ficam as zonas radiativas e convectivas, onde a energia se propaga por radiação na primeira, sendo transportadas pelos fótons (partícula de luz sem massa). E a zona convectiva, onde a energia se propaga por convecção pelo movimento molecular do gás devido à diferença de temperatura entre a parte superior e inferior desta região.
Mas a parte mais intrigante e responsável pelo que vimos até aqui é o núcleo solar, local onde ocorrem intensas reações nucleares e produção de energia, e tudo começa na formação do Sol, em uma região do Universo em que havia uma imensa nuvem de gás e poeira interestelar.
Quando uma onda de choque proveniente de explosão de supernovas ou da colisão de duas galáxias atinge esta nuvem, ela fica gravitacionalmente instável e começa a se contrair, formando glóbulos de até 1 ano-luz de extensão. Esses glóbulos ou nuvens de gás, são em sua maioria formados por átomos de hidrogênio que, devido à sua autogravidade, começam a se contrair e adquirir uma forma esférica, que atrai mais massa de gás e poeira que esteja ao seu redor. Então, as partículas que compõem o gás estão em queda livre, uma em direção às outras, transformando energia potencial gravitacional em energia cinética, chegando a colidir entre si, aumentando assim sua agitação térmica, transformando a energia cinética da queda em energia térmica. A temperatura então começa a se elevar cada vez mais, até chegar ao ponto de iniciar as reações de transmutação de H em He.
A esse ponto a temperatura no núcleo solar é de 15 milhões de graus Celsius. Essa imensa quantidade de energia vai ter que ser liberada de alguma forma. Mas antes falta um detalhe! Voltando na imagem da figura 1, se as forças geradas pela grande pressão interna for muito grandes a nuvem ou o glóbulo se desfaz, se o peso vencer ela colapsa. Mas se a atração e repulsão forem iguais, o equilíbrio permanece e o Sol se mantém estável e, liberando energia na forma de radiação e calor.
O processo de fusão inicial envolvem estes núcleos de hidrogênio apresentados na figura acima, numa reação chamada cadeia próton-próton (cadeia p-p). Na primeira etapa da cadeia p-p (lado direito da Figura 5 acima), dois átomos de H se fundem para formar um núcleo de deutério, um pósitron e um neutrino. O neutrino escapa da estrela, mas o pósitron colide com o elétron, liberando energia na forma de radiação. Na segunda etapa o deutério se funde com outro H, formando o isótopo de hélio ($ ^{3}H $) com dois prótons e um nêutron, liberando fótons (raios gama $\gamma$). E na terceira reação, dois isótopos de fundem para formar um átomo de hélio $ ^{4}He $ e dois núcleos de H.
Como dito anteriormente, o Sol tem uma enorme reserva de hidrogênio, que faz com que seja possível manter essas reações constantes, ficando estável por um longo período. Mas o que pode acontecer com o Sol se essa reserva de hidrogênio se esgotar?
Quando todo aquele hidrogênio virar hélio, o Sol se tornará uma gigante vermelha com tamanho e massa suficiente para retomar os processos de fusão em seu núcleo, desta vez colidindo átomos de He, formando carbono. Daí em diante a temperatura do núcleo é insuficiente para fundir carbono em elementos mais pesados. Então o Sol se desestabiliza, isto é, perde seu equilíbrio e entra em colapso, marcando o fim de sua produção de energia. Com o colapso a parte externa é ejetada lançando matéria e poeira no espaço formando uma nebulosa planetária. O que sobra é um núcleo muito denso composto em sua maior parte de carbono, mais ainda muito brilhante denominado de anã-branca.
O nosso Sol já percorreu metade do seu ciclo evolutivo, estando com uma idade de cerca de 4,5 bilhões de anos e devendo durar por mais uns 5 ou 6 bilhões de anos até consumir todo seu estoque de hidrogênio. Quando se tornar uma gigante vermelha o seu raio atingirá a órbita da Terra, engolindo Mercúrio e Vênus. Nesse ponto, a vida na Terra já terá se extinguido há muito tempo! Daqui a aproximadamente 1.1 bilhões de anos o Sol será $10\%$ maior, elevando a temperatura terrestre, provocando um efeito estufa mais acentuado. Daqui a 3.5 bilhões de anos o Sol será $40\%$ maior, a radiação solar fará com que a água dos oceanos evapore e a temperatura na superfície da Terra chegue a $700^\circ C$, vaporizando toda água da Terra.
A pergunta que falta responder é: o Sol tem alguma relação com as estrela? Elas parecem frias e não brilham como Sol. Mas na verdade, o processo de formação e evolução das estrelas é exatamente igual ao que foi descrito aqui para o Sol. A grande diferença é a distância, pois as estrelas estão muito, mas muito longe, a anos-luz de distância! A mais próxima de nós é Alpha Centauri a cerca de 4,3 anos-luz, bem longe do sistema solar e por isso não notamos o seu brilho como notamos o do Sol, mas é tão brilhante e massiva quanto o Sol (na verdade Alpha Centauri é um sistema duplo, formado por duas estrelas, uma um pouco maior, outra um pouco menor que o nosso Sol). Outra importante diferença é a massa inicial das estrelas que irá influenciar no seu processo evolutivo, e que vai definir a sua capacidade de produzir elementos mais pesados que o carbono.
How the sun shines. THE NOBEL PRIZE, 2000.
Disponível em: https://www.nobelprize.org/prizes/themes/how-the-sun-shines/.
Acesso em: 03, out 2020.
O Sol - a nossa estrela. Astronomia e Astrofísica, 2019.
Disponível em: http://astro.if.ufrgs.br/esol/esol.htm.
Acesso em: 03, out 2020.
FALCIANO, Felipe Tovar. Nós, as estrelas e o universo. Ilustríssima Física, 2019.
Disponível em: https://www2.cbpf.br/downloads/divulgacao-cientifica/livros/Ilustrissima-fisica.pdf.
Acesso em: 03, out 2020.
Sol. Wikipédia, 2020.
Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sol.
Acesso em: 03, out 2020.
PICAZZIO, Enos. O céu que nos envolve: Introdução à astronomia para educadores e iniciantes, 2011.
Disponível em: http://www.astro.iag.usp.br/OCeuQueNosEnvolve.pdf.
Acesso em 03, out 2020.